segunda-feira, 24 de maio de 2010

MINISSAIA VERMELHA: VERSÃO PÓS-MODERNA DE CHAPEUZINHO VERMELHO

MINISSAIA VERMELHA: VERSÃO PÓS-MODERNA DE CHAPEUZINHO VERMELHO

Josenildo Silva de Souza

Seu corpo é fruto proibido
É a chave de todo pecado
E da libido
E prum garoto introvertido
Como eu! É a pura perdição
(Olhar 43 -RPM)

Caminhando pelo Campus da Universidade Bandeirantes (Uniban), em direção a sala de aula do Curso de Turismo, Minissaia Vermelha foi chamada de “vagabunda” e teve que deixar a instituição de ensino escoltada pela Polícia Militar sob os gritos dos colegas de sala. Vagabunda! Vagabunda! Eles chegaram ao ponto de cercá-la e intimidá-la. Pensei que estava diante do suplício de Geni, personagem central da canção Geni e o Zepelin de Chico Buarque2. Essa foi a recompensa que ela ganhou por se vestir daquela maneira para ir a uma festa e, antes de ir, resolveu, como toda boa aluna, dá uma passandinha na sala de aula para não levar falta. Esse fato ocorreu durante uma aula que foi interrompida devido ao tumulto causado.

Segundo matéria publicada no Diário de São Paulo no dia 30/10/2009, ela não vai às aulas desde o incidente, largou até o emprego, vive trancada em casa e promete até mesmo processar as pessoas que continuam lhe ofendendo.

- Ela gosta de aparecer - disse um deles. Para esse aluno puritano, educação não rima com sexualidade e, muito menos, com prazer. Estudar não é um ato prazeroso e que instiga a nossa tesão. As pernas de fora de Minissaia Vermelha estavam atrapalhando os seus estudos, a sua concentração. Assim, ele não conseguiria aprender. Ela só pensa naquilo3. Deve ter pensado!

- Nós, alunos homens da Uniban, ficamos com a imagem prejudicada. Estamos aqui para estudar. Nada justifica o que aconteceu. Quem promoveu isso deve ser punido - pediu Elias Alves Conceição, de 19 anos, que estuda educação física. E a punição não foi branda4! Beirou a barbárie!
Ainda de acordo com a referida matéria, “nada justifica a atitude agressiva dos alunos” disse Mário Sérgio Cortella, ex-secretário municipal de Educação de São Paulo. Segundo ele,

a jovem tem o direito de utilizar a roupa que deseja, desde que ela não ultrapasse aquilo que é a norma coletiva, a convivência. Aqueles que reagiram de forma absolutamente exagerada, podiam tê-la reprovado do ponto de vista estético, se não desejavam a roupa daquele modo. Mas, jamais, do ponto de vista ético, que é a agressão, a brutalidade, a violência, o desrespeito, a intolerância - diz o educador.

Em nota, a Uniban afirma que sua posição é de total repúdio a qualquer manifestação de preconceito de gênero e qualquer forma de difamação ou violência. No entanto, a própria instituição de ensino se encaregou divulgar nota expulsando a aluna por considerá-la responsável pela situação e “flagrante desrespeito aos princípios éticos, à dignidade acadêmica e à moralidade”. No dia seguinte a expulsão, a Uniban volta atraz dada repercursão internacional do fato.
Pois bem! A questão que se nos apresenta agora é a seguinte: Por que os alunos da referida universidade se mostraram tão indignados diante daquela cena? Não sabem eles que as roupas que vestimos tem, dentre outros propósitos, o de nos embelezar e de nos fazer objeto de desejo, poder de sedução, expressa a nossa sexualidade? Não é para isso que ficamos horas a fio escolhendo minuciosamente cada peça, passando horas e mais horas na frente do espelho tentando se encontrar na imagem refletida nele (Lacan)? E que é através do nosso corpo que sentimos as primeiras sensações de prazer que impulsionarão o nosso conhecimento posterior (Hume)? E mais, ainda, que nosso corpo é marcado por valores culturais, crenças, tradições é vítima de dispositivos ideológicos, repressivos e disciplinares (Foucault)? Deveriam saber! Se não sabem, recomendo as obras abaixo relacionadas.

De acordo com os valores da nossa sociedade, Minissaia Vermelha e os demais alunos deveriam saber é que nosso corpo é permeado pelo tabu, pela proibição, é a chave de todo pecado e da libido. A expulsão de Adão e Eva do Paraíso se deu em função deles terem desobedecido a Deus ao comerem do fruto proibido. Nossa sociedade tem em relação ao nosso corpo, fonte da nossa libido, uma atitude diferenciada, ambivalente, contraditória. Para não dizer hipócrita!

Quando uma criança do sexo masculino nasce o pai, orgulhoso, trata logo de mostrar aquela parte do corpo que Freud6 considera que é a fonte da inveja que a mulher tem do homem. Ele mostra, ele pega e brinca e todos ficam, então felizes. Quando a criança cresce ele, o pai, leva-o ao encontro com os amigo e manda o menino mostrar com orgulho. No caso de uma criança do sexo feminino, o mesmo não acontece. O comportamento, a atitude é outra. De imediato, a menina é castrada simbolicamente. Ela não pode mostrar a região genital. Os adultos tratam logo de cobrí-la, de reprimí-la. Assim, a nossa sociedade vai moldando a relação que homens e mulheres terão em relação ao seu corpo. Os meninos são educados para sair. As meninas são educadas para ficarem em casa.

Nossa sociedade tende a valorizar os homens que têem uma vida sexual ativa e expressiva: é um garanhão! Em relação as mulheres, ela é uma ....! Os homens são elevados, exaltados. As mulheres rebaixadas na sua condição. A representação imaginária do órgão sexual masculino na sociedade denota muito mais agressividade que prazer haja vista os nomes que recebem no imaginário social: pau, chibata, cacete, etc, instrumento de tortura e agressão e a relação sexual como ato canibal de devoração do Outro: vou comer!

Não devemos nos esquecer que a intolerância, o preconceito, o ódio em relação ao Outro, ao diferente tem levado, com frequência, a práticas de barbárie justificadas em nome de uma falsa moral, em nome da honra que não se justifica levando as vítimas a se sentirem responsabilizadas e culpadas pelas atrocidades que sofreram: “...E a sociedade vai lhe condenar. Morreu violentada porque quis. Saia, falava, dançava. Podia estar quieta e ser feliz. Calada, cuada, castrata” 7. Meu Deus! O que fiz para merecer isso? Você procurou! A culpa é sua!

Para não interromper os estudos e as aulas voltarem ao normal, penso que a Universidade tem, diante desse fato, uma oportunidade ímpar para refletir sobre a sexualidade, os prazeres do corpo, relações de gênero, moda, intolerância, preconceitos, violência, moral, etc. Professores! Fiquem atentos para as atitudes dos seus alunos em sala de aula. Elas podem revelar um conteúdo valiossíssimo a ser trabalhado em sala de aula.

Agora, cá prá nós! Dou por visto a festa que os colonizadores portugueses civilizados fizeram quando chegaram aqui no Brasil e viram os nativos da terra, incivilizados, nus! Ah!Encontramos paraíso!!!!

Um comentário:

  1. prof amei seu texto!!!
    bem q vc poderia leva-lo para nós!!!
    Ceiça Santana aluna do 6º período de Pedagogia UVA

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