quinta-feira, 18 de outubro de 2012

ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA DE CARL ROGERS


Josenildo Silva de Souza
 
O objetivo desta aula é apresentar, de maneira resumida, as idéias centrais da abordagem centrada na pessoa a qual foi desenvolvida a partir da experiência clínica do psicólogo americano Carl Rogers e como ela pode ser trabalhada em prol do aperfeiçoamento do processo de ensino-aprendizagem.
Segundo Rogers, há um campo de experiência único para cada indivíduo; este campo de experiência ou campo fenomenal contém tudo o que se passa no organismo em qualquer momento, e que está potencialmente disponível à consciência. Inclui eventos, percepções, sensações e impactos dos quais a pessoa não toma consciência, mas poderia tomar se focalizasse a atenção nesses estímulos. É um estímulo privativo e pessoal que pode ou não corresponder à realidade objetiva.
Dentro do campo da experiência está o self. Rogers usa o self para se referir ao contínuo processo de reconhecimento da pessoa. O self ou autoconceito é a visão que uma pessoa tem de si própria, baseada em experiências passadas, estimulações presentes e expectativas futuras.
O self ideal é o conjunto de características que o indivíduo mais gostaria de poder reclamar como sendo descritivas de si mesmo. A extensão da diferença entre o self e o self ideal é um indicador de desconforto, insatisfação e dificuldades neuróticas. Quanto maior a extensão da diferença, maiores as possibilidades da pessoa está vivenciando uma experiência neurótica. Aceitar-se como se é na realidade, e não como se quer ser, é um sinal de saúde mental. Aceitar-se não é resignar-se ou abdicar de si mesmo; isto é, não significa que o indivíduo deva se conformar com sua real situação, mas sim, tomar consciência dela de maneira que a partir dela possa extrair motivações para o crescimento. É uma forma de estar mais perto da realidade, de seu estado atual. A imagem do self ideal, na medida em que se diferencia de modo claro do comportamento e dos valores reais de uma pessoa é um obstáculo ao crescimento pessoal.
Segundo Rogers, a hipótese central dessa abordagem pode ser colocada em poucas palavras. Os indivíduos possuem dentro de si vastos recursos para autocompreensão e para modificação de seus autoconceitos, de suas atitudes e de seu comportamento autônomo. Esses recursos podem ser ativados se houver um clima, passível de definição, de atitudes psicológicas facilitadoras;
Há três condições que devem estar presentes para que se crie um clima facilitador de crescimento. Estas condições se aplicam, na realidade, a qualquer situação na qual o objetivo seja o desenvolvimento da pessoa.
O primeiro elemento diz respeito a autenticidade, sinceridade ou congruência. Quanto mais o indivíduo for ele mesmo na relação com o outro, quanto mais puder remover as barreiras profissionais ou pessoais, maior a probabilidade de que o outro mude e cresça de um modo construtivo. Isso significa que o indivíduo está vivendo abertamente os sentimentos e atitudes que fluem naquele momento. O termo transparente expressa bem essa condição: o indivíduo se faz transparente para o outro. O outro pode ver claramente o que o indivíduo é na relação: o outro não se defronta com qualquer resistência por parte do indivíduo. Do mesmo modo que para o indivíduo, o que o outro vive pode se tornar consciente, pode ser vivido na relação e pode ser comunicado se for conveniente. Portanto, dá-se uma grande correspondência, ou congruência, entre o que está sendo vivido em nível profundo, o que está na consciência e o que está sendo expresso pelo outro.
Congruência é definida como o grau de exatidão entre a experiência da comunicação e a tomada de consciência. Ela se relaciona às discrepâncias entre experienciar e tomar consciência. Um alto grau de congruência significa que a comunicação (o que você está expressando), a experiência (o que está ocorrendo em seu campo) e a tomada de consciência (o que você está percebendo) são todas semelhantes. Suas observações e as de um observador externo seriam consistentes.
A incongruência ocorre quando há diferenças entre a tomada de consciência, a experiência e a comunicação desta. É definida não só como inabilidade de perceber com precisão mas também como inabilidade ou incapacidade de comunicação precisa. Quando a incongruência está entre a tomada de consciência e a experiência, é chamada de repressão. A pessoa simplesmente não tem consciência do que está fazendo. Quando a incongruência é uma discrepância entre a tomada de consciência e a comunicação a pessoa não expressa o que está realmente sentindo, pensando ou experienciando.
A segunda atitude importante na criação de um clima que facilite a mudança é a aceitação, o interesse e a consideração – aceitação incondicional. Quando o indivíduo está tendo uma atitude positiva, aceitadora, em relação ao que quer que o outro seja naquele momento, a probabilidade de ocorrer um movimento de mudança aumenta. O indivíduo que deseja que o outro expresse o sentimento que está ocorrendo no momento, qualquer que seja ele – confusão, ressentimento, medo, raiva, coragem, amor ou orgulho. O indivíduo tem uma consideração integral e não condicional pelo cliente, daí porque se faz necessário que a pessoa esteja aberta a tudo o que o outro tem a dizer para poder compreende-lo plenamente e se fazer compreendido.
O terceiro aspecto facilitador da relação é a compreensão empática. Com isso quero dizer que o indivíduo capta com precisão os sentimentos e os significados pessoais que o outro está vivendo e comunica essa compreensão a ele. Quando está em sua melhor forma, o indivíduo pode entrar tão profundamente no mundo interno do outro que se torna capaz de esclarecer não só o significado que o outro está consciente como também do que se encontra abaixo do nível de consciência.
Se as pessoas são aceitas e consideradas, elas tendem a desenvolver uma atitude de maior consideração em relação a si mesmas. Quando as pessoas são ouvidas de modo empático, isto lhes possibilita ouvir mais cuidadosamente o fluxo de suas experiências internas. Mas, à medida em que uma pessoa compreende e considera o seu eu, este se torna mais congruente com suas próprias experiências. A pessoa torna-se então mais verdadeira, mais genuína. Essas tendências, que são a recíproca das atitudes dos outros, permitem que a pessoa seja uma propiciadora mais eficiente de seu próprio crescimento. Sente-se mais livre para ser uma pessoa verdadeira e integral.
A prática, a teoria e a pesquisa deixam claro que a abordagem centrada na pessoa baseia-se na confiança em todos os seres humanos e em todos os organismos. Em cada organismo, não importa em que nível, há um fluxo subjacente de movimento em direção à realização construtiva das possibilidades que lhes são inerentes. Há também nos seres humanos uma tendência natural a um desenvolvimento mais completo e mais complexo. A expressão mais usada para designar esse processo é a tendência realizadora, presente em todos os organismos vivos.
A necessidade de explorar e de produzir mudanças no ambiente, a necessidade de brincar e de se auto-explorar – todos esses e muitos outros comportamentos são expressão dessa tendência auto-realizadora.
Os organismos estão sempre em busca de algo, sempre iniciando algo, sempre prontos para alguma coisa. Há uma fonte central de energia no organismo humano. Essa fonte é uma função do sistema como um todo, e não de uma parte dele. A maneira mais simples de conceitua-la é como uma tendência à plenitude, à auto-realização, que abrange não só a manutenção mas também o crescimento do organismo.
Tendência formativa é uma tendência sempre atuante em direção a uma ordem crescente e a uma complexidade inter-relacionada, visível tanto no nível inorgânico como no orgânico. O universo está em constante construção e criação, assim como em deterioração. Este processo também é evidente no ser humano.
Qual o papel desempenhado por nossa consciência nessa função formativa? A capacidade de prestar atenção consciente parece ser uma das mais recentes etapas evolutivas da espécie humana. Essa capacidade pode ser caracterizada como um pequeníssimo pico de consciência, de capacidade de simbolização, no topo de uma vasta pirâmide de funcionamento não consciente do organismo. Tudo indica que o organismo humano vem progredindo em direção a um desenvolvimento cada vez mais pleno da consciência.
Havendo maior autoconsciência torna-se possível uma escolha mais bem fundamentada, uma escolha mais livre de introjeções, uma escolha consciente mais em sintonia com o fluxo evolutivo. Essa pessoa está potencialmente mais consciente, não só dos estímulos como também das idéias e sonhos, do fluxo de sentimentos, emoções e reações fisiológicas advindas do seu interior. Quanto maior essa consciência, mais a pessoa flutuará segura numa direção afinada com o fluxo evolutivo.
Portanto, essa abordagem dá ênfase a relações interpessoais e ao crescimento que delas resulta, centrado no desenvolvimento da personalidade do indivíduo, em seus processos de construção e organização pessoal da realidade, e em sua capacidade de atuar, como pessoa integrada. Dá-se igualmente ênfase à vida psicológica e emocional do indivíduo e à preocupação com a sua orientação interna, com o auto conceito, com o desenvolvimento de uma visão autêntica de si mesmo, orientada para uma realidade individual e grupal.
Como essa abordagem concebe o homem, o conhecimento, a educação, a escola, o processo ensino-aprendizagem, a relação professor-aluno, a metodologia e a avaliação do aluno?
O homem é considerado como uma pessoa situada no mundo. É único, quer em sua vida interior, quer em suas percepções e avaliações do mundo. A pessoa é considerada em processo contínuo de descoberta de seu próprio ser, ligando-se a outras pessoas e grupos. O homem não nasce com um fim determinado, mas goza de liberdade plena e se apresenta como um projeto permanente e inacabado. Não é resultado, cria-se a si próprio. É, portanto, possuidor de uma existência não condicionada a priori . A crença na fé e a confiança na capacidade da pessoa, em seu próprio crescimento, constituem o pressuposto básico da teoria rogeriana.
A experiência pessoal e subjetiva é o fundamento sobre o qual o conhecimento é construído, no decorrer do processo do vir-a-ser da pessoa humana. É atribuído ao sujeito, portanto, papel central e primordial na elaboração e criação do conhecimento. Ao experienciar, o homem conhece. A experiência constitui, pois, um conjunto de realidades vividas pelo homem, realidades essas que possuem significados reais e concretos para ele e que funciona, ao mesmo tempo, como ponto de partida para mudança e crescimento, já que nada é acabado e o conhecimento possui uma característica dinâmica.
A educação tem como finalidade primeira a criação de condições que facilitem a aprendizagem do aluno, e como objetivo básico liberar a sua capacidade de auto-aprendizagem de forma que seja possível seu desenvolvimento tanto intelectual quanto emocional. Seria a criação de condições nas quais os alunos pudessem tornar-se pessoas de iniciativa, de responsabilidade, de autodeterminação, de discernimento, que soubessem aplicar-se a aprender as coisas que lhes servirão para a solução de seus problemas e que tais conhecimentos os capacitassem a se adaptar com flexibilidade às novas situações, aos novos problemas, servindo-se da própria experiência, com espírito livre e criativo. Tudo que estiver a serviço do crescimento pessoal, interpessoal ou intergrupal é educação.
Em relação a escola, o princípio básico consiste na idéia da não interferência com o crescimento da criança e de nenhuma pressão sobre ela. Se faz necessário o estabelecimento de um clima de aprendizagem, de compromisso, até que seja possível uma inteira liberdade para aprender.
O ensino está centrado na pessoa (primado do sujeito), o que implica técnicas de dirigir sem dirigir, ou seja, dirigir a pessoa à sua própria experiência para que, dessa forma, ela possa estruturar-se e agir. A não-diretividade consiste num conjunto de técnicas que implementa a atitude básica de confiança e respeito pelo aluno.
A não-diretividade pretende ser um método não estruturante do processo de aprendizagem, pelo qual o professor se abstém de intervir diretamente no campo cognitivo e afetivo do aluno, introduzindo valores, objetos etc, constituindo-se apenas num método informante do processo de aprendizagem do aluno, pelo qual o professor não dirige propriamente esse processo, mas apenas se limita a facilitar a comunicação do estudante consigo mesmo, para ele mesmo estruturar seu comportamento experiencial.
O professor é, primariamente, uma personalidade única. É considerado como um único ser humano que aprendeu a usar-se efetiva e eficientemente para realização de seus próprios propósitos e os da sociedade, na educação de todos. Cada professor desenvolverá seu próprio repertório de uma forma única, decorrente da base perceptual de seu comportamento. O processo de ensino irá depender do caráter individual do professor, como ele se inter-relaciona com o caráter individual do aluno. A competência básica consistiria, unicamente, na habilidade de compreender-se e de compreender ou outros.
A autenticidade e a congruência são consideradas condições facilitadoras da aprendizagem, as quais, por sua vez, irão facilitar um processo de autenticidade ou congruência na pessoa ajudada. Isso implica que o professor deva aceitar tal como é e compreender os sentimentos que ele possui.
Para Rogers, quando consideramos as características políticas da educação, percebe-se que o modelo tradicional situa-se num dos pólos de um conjunto que tem em seu pólo oposto uma abordagem centrada na pessoa.
Na abordagem tradicional: 1. Os professores são os possuidores de conhecimento, os alunos são os supostos recipientes; 2. A aula expositiva, ou outros recursos de instrução verbal, é o principal recurso para incutir conhecimentos nos alunos. Os exames medem o quanto eles o adquiriram; 3. Os professores são os detentores do poder, os alunos os que obedecem. O controle é sempre exercido de cima para baixo; 4. Dominar através da autoridade é a política vigente em sala de aula. A figura de autoridade – o professor – é a figura central na educação; 5. A confiança é mínima; 6. Os sujeitos (alunos) são mais bem governados se mantidos num estado intermitente ou constante medo; 7. A democracia e seus valores são ignorados na prática. Os alunos não participam da escolha de suas metas, currículos ou estilos de estudos individuais. Escolhe-se por eles; 8. Não há lugar para pessoas inteiras no sistema educacional, só há lugar para seus intelectos.

Por sua vez, a abordagem centrada na pessoa se apresenta como oposta a anterior. 1. Pré-condição: Os líderes, ou pessoas percebidas como representantes da autoridade na situação, são seguras interiormente e em seus relacionamentos pessoais, de modo a confiarem na capacidade das outras pessoas de pensar, sentir e aprender por si mesmas; 2. As pessoas facilitadoras compartilham com as outras – os estudantes, e se possível também os pais ou membros da comunidade – a responsabilidade pelo processo de aprendizagem; 3. Os facilitadores oferecem recursos de aprendizagem – de dentro de si mesmo, de suas próprias experiências, de livros ou de outros materiais ou de experiências da comunidade; 4. Os estudantes desenvolvem seus próprios programas de aprendizagem, individualmente ou em cooperação; 5. Cria-se um clima facilitador da aprendizagem; 6. O foco da aprendizagem é, primordialmente, a promoção da continuidade do processo de aprendizagem; 7. A disciplina necessária à consecução das metas dos estudantes é a autodisciplina, e é reconhecida e aceita pelos alunos como de sua responsabilidade. A autodisciplina substitui a disciplina externa; 8ª avaliação da extensão e do significado da aprendizagem de cada um é feita primordialmente pelo próprio aluno; 9. Neste clima de promoção do crescimento, a aprendizagem tende a ser mais profunda, processar-se mais rapidamente e ser mais penetrante na vida e no comportamento dos alunos que a aprendizagem realizada na sala de aula tradicional.

2 comentários:

  1. Breve resumo. ;)

    http://pt.shvoong.com/social-sciences/psychology/2366401-carl-rogers-abordagem-centrada-na/

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  2. Oi, vc não colocou a referencia ao livro Um Jeito de Ser do Rogers. ;)

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