SOBRAL,
MURIÇOCAS E RAQUETES
Josenildo
Silva de Souza1
"...A muriçoca
doida, que esvoaçava havia muito tempo em torno do corpo dele,
assanhando-lhe os desejos, acordando-lhe as fibras embambecidas pela
saudade da terra, picando-lhe as artérias..."
O Cortiço. Aluísio Azevedo.
O Cortiço. Aluísio Azevedo.
ZZZZZZ, é o barulho provocado por um inseto que a
população de Sobral2
está acostumada a ouvir diariamente e, principalmente, à noite
quando vai dormir em suas residências. Barulho quase que
ensurdecedor uma vez que é de tirar o sono de qualquer um, seja ele
ou ela criança ou adulto. Como se não bastasse, esse inseto
chamado popularmente de muriçoca3
invadiu todos os cantos da cidade, nos três turnos 24 horas sem
parar. Não há lugar na cidade de Sobral onde elas não tenham,
ainda, invadido.
Contudo, o barulho não é, apenas, um dos traços
característicos das muriçocas. Podemos citar muitos outros, dentre
eles: elas são sanguessugas. Sugam o sangue de suas vítimas e,
dependendo do seu tamanho, sua picada parece mais uma ferroada de
maribondo4.
Quem quer que esteja acordado ou dormindo, sabe o quanto a picada é
dolorida.
As muriçocas põe seus ovos preferencialmente em águas
poluídas, ricas em matéria orgânica em decomposição e detritos,
tais como cisternas, esgotos, bueiros, fossas, ralos, poços, águas
paradas, etc. Todos nós sabemos perfeitamente disso! Tanto o cidadão
comum, se é que podemos fazer uso dessa expressão, quanto as
autoridades responsáveis pela vigilância sanitária da cidade.
Porém, o que assistimos é a população desesperada,
aflita à procura de soluções privadas para um problema que é
público. Uma dessas soluções privadas, e que nos chama mais a
atenção, é a aquisição de raquetes que disparam uma descarga
elétrica matando o inseto tão logo ele toque na sua superfície.
Caminhando pela cidade vemos pessoas, de crianças a idosos, umas se
divertido, outras desesperadas, fazendo uso dessas raquetes em casa
ou no meio da rua, na ânsia de se livrar delas. Porém, as
estratégias que utilizam não passam de uma verdadeira ilusão, uma
vez que buscam eliminá-las quando elas estão na fase adulta e não
na fase inicial,ou seja, nos locais onde mais se reproduzem. (Ver:
parágrafo anterior). Eis porque considero que a população busca
soluções privadas para problemas que têem um dimensão pública.
As autoridades sanitárias do município de Sobral tem
de encontrar medidas enérgicas para resolver o problema pois, do
contrário, a população, na esfera da privacidade, vai em vão
procurar soluções e não vai conseguir se livrar desse inseto, e de
outros, que se reproduzem nas mesmas condições. Se continuar agindo
dessa maneira, a população corre um grande risco de acabar com os
estoques de raquetes que são vendidas nos estabelecimentos
comerciais, proporcionando-lhes lucros astronômicos, ou morrendo
intoxicada ao fazer uso de inseticidas, altamente tóxicos, que põem
em risco a sua saúde.
Agora, cá pra nós! Sinceramente, ao vermos uma pessoa
fazendo uso dessas raquetes fora da quadra de tênis, na praia ao
jogar frescobol ou numa mesa de ping-pong ou tênis de mesa, não nos
dá a impressão que a pessoa está tendo uma crise psicótica? Cadê
a bola, afinal? Creio que mesmo assim, quem sabe teremos no futuro
uma Maria Esther Bueno ou um Gustavo Kuerten aqui em Sobral. Quer
esperar pra ver? “E não adianta vir mim
dedetizar, pois nem DDT pode assim mim exterminar, porque você mata
uma e vem outra em meu lugar...”5
1Psicólogo
e Professor da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA
2Cidade
da Região Norte do Estado do Ceará à 238 km da Capital Fortaleza
3Nome
Tupi: mberu'soka: pernilongo. Formado do tupi mberu (mosca) e 'soka
(que fura)
4Inseto
himenóptero da família Pompilidae ou denominação mais genérica
para qualquer uma das maiores espécies de vespas;
5Mosca
na sopa. Raul Seixas
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